quinta-feira, 5 de novembro de 2015

Anatomia de Sousa



Vamos variar um pouco os textos.
Falo muito do coração e da dor que ele causa e sofre.
Mas outro órgão se lembrou de causar uma dor maior.
É uma espécie de chamada telefónica da Morte.

Ninguém sabe muito bem para que ele serve.
Excepto para ser um despertador natural da Morte.
Mas enquanto a Morte se levanta e prepara.
Desta cama de hospital vou-vos falar do apêndice.

Órgão estúpido que tem o belo e cru prazer.
De nos poder levar a vida para longe de nós.
É engraçado se pensarmos um pouco nisto.
E concluirmos que temos estado a ver mal este assunto.

Pensámos que o coração e o cérebro eram o casal perfeito.
Mas não o são.
O cérebro é mais um irmão mais velho do coração.
Responsável e cuidador do seu irmãozinho pequeno.

Mas o apêndice é o correcto parceiro amoroso do coração.
Ora reparem que o apêndice pode nos rebentar fisicamente e nos matar o corpo.
Mas o coração pode fazer o mesmo e mais.
Pode rebentar-nos psicologicamente e nos matar a alma.

Tratam-se assim de ser a cara metade um do outro.
O par perfeito para o crime e dor.
O par perfeito na saúde e na doença, na alegria e na tristeza.
Até que a morte os separe.

O cérebro bem impede o coração de socializar com o apêndice.
Como o pai que avisa a filha.
Mas o coração olha para o apêndice e vê um rebelde.
Um rebelde desta sociedade anatómica.

Um rebelde que conquista o coração.
O seduz e cativa a magoar a sociedade.
Numa onda de crime e dor.
Enquanto esperam pela senhora do vestido preto e foice aparecer.

Mas o curioso é que o que os une, é o que os separa.
Quando o coração sofre, o apêndice deixa-lo sofrer.
Quando o apêndice sofre, arrasta o coração consigo.
Só que o coração tem o cérebro e o apêndice tem ninguém.

E enquanto o coração recupera e está pronto para outra relação.
O apêndice ataca tudo e todos e evita culpas, destruindo tudo e todos.
Para evitar sofrer, entrega-se a si e a sociedade à Morte.
Para simplesmente fazer desaparecer a dor e abraçar a serenidade.

O apêndice conta com o coração para esta operação.
De realizarem um suicídio em massa.
Mas o coração supera a dor da perda.
O apêndice sozinho mutila-se e de destrói, tal bombista-suicida.

Se não fosse o cérebro, se não fosse nós.
Caímos nas dores de amor, causadas pelo coração.
Caímos nas dores solitárias egoístas, causadas pelo apêndice.
E talvez não fosse mal pensado.

Sofremos tanto quando desejamos não sofrer.
E enquanto o nosso apêndice vai olhando para o relógio.
Temos o nosso coração fustigado pelos desmembramentos de relacionamentos.
E a campainha toca e a Morte está à porta.

É mais fácil abraçar a fria e suave Morte.
Do que enfrentar a dura e cruel dor da Vida.
E francamente, não seria mais fácil.
Se aceitássemos essa selecção natural e aceitássemos esse destino?

Ultimamente, o egoísmo do apêndice.
Era a salvação do coração.
Se deixássemos de sofrer por amor.
Seríamos felizes e finalmente poderíamos descansar em paz.
(Metafórica e Literalmente falando).

(Por sugestão da fã C.S.)

Sem comentários:

Enviar um comentário