PARTE 1
Meia-noite. A chuva caía lá fora, regando o jardim de flores que ainda resiste ao doloroso Inverno. O vento pede para entrar mas Afonso ignorava o suplício da Mãe Natureza. Afonso tinha os seus trinta anos de idade e era um rapaz humilde mas como o vento, é impetuoso e frequentemente age antes de pensar. É um rapaz alto, ruivo de olhos castanho-avelã e tinha uma silhueta magra. Morava numa aldeia para Trás-os-Montes, onde tinha poucos vizinhos e qualquer mercearia era uma viagem de meia hora ou mais de carro até esse destino. Morava sozinho. Os pais tinham morrido em pequeno num acidente de carro e ele não tinha ninguém, acabando por ir parar a um orfanato. A sua timidez impedia que fizesse amigos com facilidade e não ajudara o facto de ver as restantes crianças a serem adoptadas e ele permanecer no mesmo local, com diferentes caras diariamente. Acabou por ficar pelo orfanato a trabalhar e ajudar nas mais variadas tarefas, desde tomar conta das crianças que lá haviam, fazer reparações pelo instituto e por vezes até cozinhar. Como pouco jeito tinha para cozinhar, encomendava sempre umas pizzas caso as coisas corressem mal, o que se tornava frequente.
Comprou uma casa pela aldeia e lá ficou a morar, sozinho. Falava mais com as crianças e com os colegas de trabalho e com os donos da mercearia. Mas de resto, era ainda reservado e passava bastante tempo em casa. Apesar da solidão, nunca estava parado. Tratava do jardim, fazia pequenos arranjos pela casa sempre que necessário e tinha um gato para lhe fazer companhia, o Cusco. Porque aonde quer que Afonso fosse, o gato aparecia quase imediatamente para ver o que andava o dono a fazer.
As coisas eram simples no dia-a-dia de Afonso. Orfanato e Casa, por vezes a mercearia pelo meio. Afonso não tinha muito mas não se podia queixar. Era feliz à sua maneira. Sentia que tinha tudo o que precisava e que tinha motivos suficientes para ser feliz. Por vezes, sentia falta de ter mais alguém em casa. Ainda pensou em adoptar mas o orfanato só entregava crianças a famílias com dois pais. Ele estava sozinho e como trabalhava muito no Orfanato, pouco tempo teria para ser um pai presente e pouco poderia dar ao seu filho. Decidiu esquecer a ideia mas sorria. Sorria porque mesmo não tendo filhos, ele tinha todas as crianças do Orfanato que o procuravam e chamavam para brincar, ler histórias ou simplesmente ajudar a adormecer. E para ele, era o mesmo que ser pai e ali podia ser o pai que quisesse, pois estava sempre presente para os pequeninos.
Mas voltando ao tempo presente, Afonso não conseguia dormir. Não por estar a chover, não por estar o vento a atirar-se contra a janela fechada. Afonso estava exausto mas não conseguia adormecer. Então divagava. Pensava em mil e uma histórias com pessoas conhecidas e inventadas e magicava centenas de situações diferentes. Ficção gratuita e por vezes ajudava a adormecer mas esta noite não. Esta noite, estava desperto e nem o conforto dos cobertores o levavam à terra dos sonhos. Isso já ele tinha, como referi anteriormente. Mas ele queria dormir e não conseguia.
Até que acabou por ouvir vidro partir-se no andar de baixo.
_ Que foi isto? - Perguntou ele, erguendo-se prontamente da cama.
Calçou os chinelos, colocou um robe e saiu do quarto. O corredor da casa era longo, uma vez que o seu quarto ficava na ponta oposta das escadas. Mas lá foi caminhando pelo meio do escuro e desceu as escadas devagarinho. Parou junto à porta da cozinha. Ouvia vidro pelo chão e quem quer que fosse, ainda estava lá. Afonso colocou a mão na maçaneta e abriu-la devagarinho. O barulho subitamente parou e ele sentiu-se apanhado. Então numa fracção de segundo, acendeu a luz e abriu a porta, com as mãos em punhos erguidos, pronto para se defender a si e à casa. Mas não estava lá ninguém. Sentiu-se confuso até que sentiu algo nas pernas a tocar-lhe. Olhou para baixo e viu os pedaços de vidros de um copo e o Cusco a olhar sério para ele.
_ Miau! - fez o gato, ao dar cabeçadas e esfregar-se pelas pernas do dono.
_ Esqueci-me de lavar o copo e apeteceu-te brincar. Ou andas com sede?
Afonso pegou na tigela branca que estava no canto da Cozinha com o nome CUSCO em letras grandes e encheu-a de água e voltou a colocá-la no sítio. O gato lá veio ver o que havia sido posto na tigela e ficou feliz por ser água, pois começou a beber.
Afonso foi à dispensa e tirou de lá uma vassoura e uma pá e varreu os cacos de vidro e colocou-os no lixo. Arrumou a vassoura e a pá no sítio depois, apagou a luz da cozinha e regressou ao quarto. Assim que se preparava para se deitar, ouvi um arranhar em madeira.
_ Vento. - Pensou ele.
Mas o arranhar era diferente. E ele lembrou-se do que poderia ser. Levantou-se, abriu a porta e disse:
_ Anda lá Cusco, hora de dormir.
O gato desencostou-se da porta e entrou no quarto, directamente saltando para a cama e enroscando-se pelos cobertores. Sob o brilho do pouco luar que entrava pela minúscula abertura que a janela tinha, o gato parecia sereno. Era um gato bem tratado, ainda novo, provavelmente com um ano de idade e era malhado. Não levava porrada, apenas era branco às pintas pretas. Ou era ao contrário? Perceberam a ideia. Era o Cusco e era o fiel companheiro de Afonso.
Este decidiu não incomodar o gato, entrando na cama devagarinho, ajustou a almofada, fez uma festinha no gato e bocejou. Sentindo finalmente o sono a chegar, bocejou e fechou os olhos, deixando-se adormecer quase imediatamente. Talvez o problema das insónias dele fosse isso, a falta de companhia. O que lhe trazia mais dúvidas se devia ou não procurar alguém. Mas essa questão ficou para depois e agora era hora de ir dormir.
PARTE 2
O dia de Afonso era um dia começado como qualquer outro: acordava antes do despertador tocar e contemplava a vista que tinha do céu lá fora, pela janela meio-aberta, mesmo antes de se levantar. O despertador acabava por tocar e ele o desligava, seguindo de um levantar da cama e uma festinha no gato que também se levantava e espreguiçava, seguindo Afonso pelo corredor e escadas abaixo até à cozinha. O gato miava e parecia sincronizar os seus miares com os roncos de fome que o estômago do dono produzia. Afonso tinha esse mesmo ritual: primeiro os outros e depois ele e com o seu gato, não era diferente. Tirou a ração do gato e colocou-a na tigela, com um bocado de leite na tigela do lado. O gato segue sempre o mesmo movimento de mão e por vezes tenta beber o leite antes de chegar ao chão ou fica para trás e entra no armário para comer a ração que lá ficara para trás.
Até que acabou por ouvir vidro partir-se no andar de baixo.
_ Que foi isto? - Perguntou ele, erguendo-se prontamente da cama.
Calçou os chinelos, colocou um robe e saiu do quarto. O corredor da casa era longo, uma vez que o seu quarto ficava na ponta oposta das escadas. Mas lá foi caminhando pelo meio do escuro e desceu as escadas devagarinho. Parou junto à porta da cozinha. Ouvia vidro pelo chão e quem quer que fosse, ainda estava lá. Afonso colocou a mão na maçaneta e abriu-la devagarinho. O barulho subitamente parou e ele sentiu-se apanhado. Então numa fracção de segundo, acendeu a luz e abriu a porta, com as mãos em punhos erguidos, pronto para se defender a si e à casa. Mas não estava lá ninguém. Sentiu-se confuso até que sentiu algo nas pernas a tocar-lhe. Olhou para baixo e viu os pedaços de vidros de um copo e o Cusco a olhar sério para ele.
_ Miau! - fez o gato, ao dar cabeçadas e esfregar-se pelas pernas do dono.
_ Esqueci-me de lavar o copo e apeteceu-te brincar. Ou andas com sede?
Afonso pegou na tigela branca que estava no canto da Cozinha com o nome CUSCO em letras grandes e encheu-a de água e voltou a colocá-la no sítio. O gato lá veio ver o que havia sido posto na tigela e ficou feliz por ser água, pois começou a beber.
Afonso foi à dispensa e tirou de lá uma vassoura e uma pá e varreu os cacos de vidro e colocou-os no lixo. Arrumou a vassoura e a pá no sítio depois, apagou a luz da cozinha e regressou ao quarto. Assim que se preparava para se deitar, ouvi um arranhar em madeira.
_ Vento. - Pensou ele.
Mas o arranhar era diferente. E ele lembrou-se do que poderia ser. Levantou-se, abriu a porta e disse:
_ Anda lá Cusco, hora de dormir.
O gato desencostou-se da porta e entrou no quarto, directamente saltando para a cama e enroscando-se pelos cobertores. Sob o brilho do pouco luar que entrava pela minúscula abertura que a janela tinha, o gato parecia sereno. Era um gato bem tratado, ainda novo, provavelmente com um ano de idade e era malhado. Não levava porrada, apenas era branco às pintas pretas. Ou era ao contrário? Perceberam a ideia. Era o Cusco e era o fiel companheiro de Afonso.
Este decidiu não incomodar o gato, entrando na cama devagarinho, ajustou a almofada, fez uma festinha no gato e bocejou. Sentindo finalmente o sono a chegar, bocejou e fechou os olhos, deixando-se adormecer quase imediatamente. Talvez o problema das insónias dele fosse isso, a falta de companhia. O que lhe trazia mais dúvidas se devia ou não procurar alguém. Mas essa questão ficou para depois e agora era hora de ir dormir.
PARTE 2
O dia de Afonso era um dia começado como qualquer outro: acordava antes do despertador tocar e contemplava a vista que tinha do céu lá fora, pela janela meio-aberta, mesmo antes de se levantar. O despertador acabava por tocar e ele o desligava, seguindo de um levantar da cama e uma festinha no gato que também se levantava e espreguiçava, seguindo Afonso pelo corredor e escadas abaixo até à cozinha. O gato miava e parecia sincronizar os seus miares com os roncos de fome que o estômago do dono produzia. Afonso tinha esse mesmo ritual: primeiro os outros e depois ele e com o seu gato, não era diferente. Tirou a ração do gato e colocou-a na tigela, com um bocado de leite na tigela do lado. O gato segue sempre o mesmo movimento de mão e por vezes tenta beber o leite antes de chegar ao chão ou fica para trás e entra no armário para comer a ração que lá ficara para trás.
Sem comentários:
Enviar um comentário