"Eu não tenho uma vida romântica, quanto mais uma saudável." - Excerto de todos os não-sociais, como eu.
Cinco da manhã. Três meses depois. Estava com alguma dificuldade em dormir. Mas qual era a novidade disso? Parece que me tenho habituado a esse ritmo nocturno. Sinto-me preso dentro de um carro, numa fila de trânsito lenta e longa. Pára, arranca. Pára, arranca. Acorda, adormece. Acorda, adormece.
Continuando, voltando ao tema: Cinco da manhã, três meses depois.
O telemóvel recebe sms e a luz pulsante e o som baixo que àquela hora pareceu suficiente para me despertar e forçar a procurar o telemóvel. Mas não o fiz. Estava cansado, queria dormir e começar a ver mensagens durante a noite e falar com as pessoas não iria ajudar.
Virei o ecrã para baixo, virei-me para o outro lado da cama e adormeci. Acordei umas horas depois cansado mas já tinha compromissos e lá despertei. Lembrei-me da mensagem de telemóvel dessa noite e peguei no telemóvel. Não conhecia o número. Mas o número era-me familiar. Talvez fosse um conhecido meu antigo e precisasse de algo. Às 5h da manhã, as hipóteses eram poucas e como não tinha carro, nada podia fazer do que dormir.
Abri a mensagem. De certeza que me daria pistas sobre quem seria a pessoa. Mentalmente foi um choque e paralisei por meio segundo, pois não esperava o que estava escrito nela. Confirmei a hora que recebi a mensagem (porque sim, isso é que era importante): 5 da manhã e alguns minutos a mais.
A mensagem tinha estes contornos: "Tenho saudades tuas. Sei que te magoei e provavelmente nem devia estar a falar-te e sei que nem me irás responder mas desculpa por tudo".
Voltei a olhar para o número e não o reconhecia. Será que foi uma mensagem por engano? Mas se o fosse, porque achava o número familiar? Por inteligência minha, guardo uma lista secundária de todos os contactos que tenho e já tive no telemóvel, num ficheiro informático, para situações em que preciso do número de um antigo conhecido ou para descobrir quem é esta pessoa. Dá jeito de vez em quando.
Abri o ficheiro. Páginas e páginas de contactos que tenho, muitos já com o números mudados e desactivados mas lá os mantenho. Enfim, activei a função localizar e comecei a digitar o número. Ao quarto dígito levei um choque. Havia pouco mais de uma dezena de contactos que correspondiam mas o seleccionado atrofiou-me. Era ela. A minha ex-namorada de três anos. A razão do blog existir. Quis parar, por medo. Se fosse mesmo ela, uma mensagem daquelas significava apenas uma coisa e eu não queria que fosse verdade. Não queria. Não podia. Não, depois de tudo o que aconteceu, não.
Introduzi o quinto dígito. Reduziram as hipóteses para sete pessoas mas ela continuava a ser a primeira. O meu coração acelerava mas a medo. "Isto não está a acontecer. Se for ela, estava bêbeda. Mas ela não bebe. E mesmo se bebesse, pessoas alcoolizadas são as que dizem as verdades, porque não pensam no que dizem e dizem o que pensam sem pensar, só a sentir.
De fora do quarto, a minha mãe insistia para me despachar, para não chegar atrasado mas eu estava noutro universo, tentando processar aquilo tudo. E se fosse ela? Como reagiria? Ficaria no silêncio? Falava? Tinha enterrado esse passado bem fundo e sentia ele dentro de mim a fazer tremer o baú onde o deixei, desejoso de sair e de me invadir com sensações que não queria sentir. Ou queria? Não, de certeza que não. Não queria voltar a passar por aquilo tudo. Não queria e não iria. Mas se seria forte o suficiente para tal?
Introduzi mais dois dígitos. O nome dela desapareceu e uma sensação de alívio acalmou-me e deixou-me em paz. Deitei-me e sorri. Sabia que não era ela e que tudo estaria bem. E quem quer que fosse, seria mais fácil e menos emocional de tratar. Vi o nome sublinhado. Era um familiar. Não fazia sentido um familiar mandar uma mensagem daquelas. Olhei para quantas opções tinha. Apenas duas. Introduzi os dois dígitos que faltavam e o ecrã só me mostrava um nome, com 100% de correspondência correcta.
E voltei a tremer. O nome que lá pertence a alguém que mexeu comigo. E tinha sido a última pessoa por quem eu tinha realmente sentimentos verdadeiros. A história é longa e pode ficar para outra altura mas essencialmente, fiz sacrifícios por ela, passei um fim-de-semana com ela e tudo coreu bem e estávamos sempre em acordo e sintonia.
Quando regressara a casa, pensei que tinha encontrado a pessoa certa. Como estava tão enganado. Pouco a pouco foi-me deixando de falar, até se silenciar e não me responder às mensagens, magoando-me. Bem feita. Mereci. Estava a dar tudo por alguém que ainda nada queria.
Três meses depois, cinco da manhã. Ela mandou-me mensagem. A dizer que tinha saudades. Que iria fazer? Responder? Silenciar-me? Apagar a mensagem? Suspirei fundo e pensei no que queria. A resposta era simples e até hoje o é: Quero ser feliz. Respondi à mensagem, mostrando que também tinha saudades dela mas não fui meigo nas seguintes.
Estava farto de ser posto em segundo plano. Então disse-lhe que tinha uma forma estranha de mostrar saudades por alguém, quando mal falava. Ela voltou a pedir desculpa. E eu perguntei-lhe sinceramente o que ela queria de mim. Se me queria a mim ou se queria apenas . . . alguém? Perguntei onde encaixava eu na vida dela? Se sentia verdadeiramente algo por mim?
Ela disse que sentia genuinamente saudades minhas mas não sabia como a via ou queria ver. Três meses inteiros depois de ter estado com ela e não sabia ainda. Iria passar por tudo de novo? Iria dar-lhe uma segunda hipótese para corrigir tudo e tentar de novo? Não acredito em segundas oportunidades.
Mandei mensagem que não estava para ser suplente de ninguém. Que não estava para esperar por alguém que nem sequer sabe se me quer na vida dela ou não. Querer quer, mas não sabe bem aonde. Para mim é insuficiente. Tem três opções: Somos amigos e tudo bem. Quer algo mais e aí terá de esforçar para me mostrar que vale a pena e voltar-me a fazer confiar e acreditar nela (depois do que me fez, tenho todo o direito em exigir). Ou seguimos os nossos caminhos separados e ninguém mais se fala. Ela que escolha. Mas não serei suplente de ninguém. Nem suplente de alguém nem refém do silêncio dela.
Nunca mais.